domingo, 18 de setembro de 2011

livraria júlio brandão (1971-1973)

pela liberdade de expressão



Faltando três anos para as comemorações dos 40 anos do 25 de Abril de 1974, fica aqui este pequeno registo histórico da Livraria Júlio Brandão, a qual desempenhou, na´designada época da abertura marcelista, um papel editorial inovador e cheio de coragem, não se salvando, contudo, das intervenções da PIDE/DGS e dos seus serviços de censura, conforme o leitor irá ver. Segundo nos conta Macedo Varela (2000: 57), um dos sócios da mesma Livraria, ao lado de Manuel Cunha, a Livraria foi "um polo de difusão de literatura progressista, nacional e também estrangeira. / A par desta difusão de livros de outros editores, a Júlio Brandão desenvolveu uma intensa actividade editorial de crítica ao regime e, sobretudo, de literatura marxista, considerada subversiva pelo regime de então." E continua mais à frente: "Para obviar às limitações legais, a edição dos livros aparecia como se fosse dos seus autores ou tradutores, mas eram na realidade totalmente da autoria da Livraria." Relevando "a coragem daqueles autores e tradutores (estes, algumas vezes, com pseudónimos) que arriscaram as represálias da Pide", diz, a dado passo, que "por mil subterfúgios, íamos conseguindo furtar algumas centenas, ou milhares (como foi o caso da 1.ª edição de "As Memórias de um Operário" - I e II volumes - em que a Pide foi surpreendida) que eram vendidos em todo o País [...] / A Livraria tornou-se conhecida a nível nacional e as suas edições de imediato adquiridas, pelo seu ineditismo e pela procura intensa do que era proibido e desejado conhecer." (VARELA, 2000: 57-58). A história dos pseudónimos é uma faceta curiosa. Apresento, por odem alfabética, as capas dos livros editados pela Livraria Júlio Brandão e farei a sua respectiva catalogação. Ora, dos tradutores constam José Pacheco Pereira, Álvaro Machado, Telmo Machado (bisneto de Bernardino Machado), José Ricardo e Maria Helena. O problema encontra-se,precisamente, nos nomes de Álvaro Machado, do qual, numa primeira leitura, calculei ser de Álvaro Manuel Machado (leitura errada, diga-se), e no de José Ricardo, o qual liguei a Lino Lima (outra leitura errada). A leitura do processo indivual de Macedo Varela da PIDE/DGS veio trazer uma nova luz, assim como a leitura do blog que se apresenta, que veio trazer novas dificuldades.



BENTO, José - História do Movimento Associativo dos Professores do Ensino Secundário: 1891 a 1932. Gomes Bento. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1973. 169 p. (Cucujães: Esc. Tip. das Missões). (Ensino e Pedagogia).



Vejamos, a este propósito, o que temos no blog http://ephemerajpp.wordpress.com/ na rúbrica com o título "Cadernos Vanguarda", de 18 de Julho de 2010: "Os cadernos Vanguarda foram publicados com o apoio e a distribuição da Livraria Júlio Brandão (iniciativa de dois membros do PCP Manuel Cunha e Macedo Varela) de Famalicão, por volta de 1971-72. A maioria dos textos foram escolhidos e traduzidos por José Pacheco Pereira e Maria Hlena Cunha, nalguns casos com nome próprio, noutros usando o nome de Álvaro Machado. O arranjo gráfico do primeiro volume foi também de José Pacheco Pereira. Os volumes 4 e 6 foram de iniciativa dos tradutores, mas usavam os seus nomes para proteger a Livraria de represálias da PIDE. Todos os volumes foram apreendidos pela Censura e proibidos de circular." Contudo, não deixa de ser curiosa a declaração de Manuel Ferreira da Cunha, que foi então "convidado a esclarecer" sobre as edições da respectiva Livraria, após as declarações de Luís Orlando dos Santos Costa, da Tipografia Orgal, do Porto, em 6 de Março de 1972. No "Auto de Declarações  de 16 de Março de 1972 incluído no processo da PIDE/DGS de Macedo Varela, ManuelCunha, segundo transcrição do mesmo "Auto de Declarações" terá dito que "Álvaro Machado é o Doutor António Macedo Varela, sócio e declarante; José Ricardo, é a mesma pessoa mas com pseudónimo diferente, por erro da tipografia; Pacheco Pereira é José Pacheco Pereira, residente nesta cidade do Porto, em local que ignora". E já na parte final das suas declarações, Manuel Cunha "esclarece que as edições são da responsabilidade dos autores e tradutores." Um outro nome a acrescentar às traduções, segundo informação de Artur Sá da Costa, é o de Eduardo Perez Sanchez, restando apenas saber quais seriam as realizadas por este membro então do Centro Académico Famalicense (CAF)


BURNSTEIN,David - O Sionismo e o Imperialismo. David Burnstein; Trad. Álvaro Machado. Ed. Álvaro Machado. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1971. 81 p. (Porto: Orgal). (Cadernos Vanguarda; 6).


Como vemos, o problema está precisamente na responsabilidade das traduções. Entre a primeira afirmação e a segunda existem opiniões diferentes. A consultar brevemente, numa das próximas idas a Lisboa, será o processo da Livraria Júlio Brandão, da PIDE/DGS, o qual se encontra no Arquivo Nacional Torre do Tombo. Na informação disponibilizada no sítio do mesmo Arquivo, lemos, na parte referente às habilitações para a criação de novas editoras, que "estas habilitações têm em anexo informações prestadas por várias entidades sobre a idoneidade moral e política dos proponentes" e "muitas das editoras não vieram a desenvolver as suas actividades por terem desistido das suas pretensões ou por terem sido recusadas pela Direccção-Geral de Censura." No caso da Livraria Júlio Brandão, segundo consta do processo de Macedo Varela e mesmo de Manuel Cunha, o projecto em causa da editora, segundo informação de 28 de Fevereiro de1972, "não oferece garantia de cooperar na realização dos fins superiores do estado". Fora de hipótese, portanto, a constituição da Livraria como editora. O subterfúgio para a publicação editorial foi, então, a Livraria Júlio Brandão aparecer como "Distribuidora". Os livros que aqui se apresentam fazem parte do espólio de Tarcísio Alves Ferreira e de Macedo Varela, à guarda do Museu Bernardino Machado. Os processos da PIDE de Manuel Cunha (que doou alguma documentação ainda em vida por altura das comemorações dos 40 anos das eleições legislativas de 1969) e de Macedo Varela encontram-se no mesmo Museu.


CARVALHO, Costa - Os Livros Escolares. Costa Carvalho. Ed. Costa Carvalho. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1972. 140 p. (Cucujães: Esc. Tip. das Missões). (Ensino e Pedagogia; 2).



CHI MINH, Ho - O Leninismo e a Libertação dos Povos Oprimidos e outros textos. Ho Chi Minh; Trad. Álvaro Machado. Ed. Álvaro Machado. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão, s. d.]. 96 p. (Porto: Orgal). (Cadernos Vanguarda; 3).



ENGELS, F. - Cartas: sobre o materialismo histórico. F. Engels; Trad. José Pacheco Pereira. Ed. José Pacheco Pereira. [V. N. de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1971. 45 p. (Porto: Tipografia Marca). (Cadernos Vanguarda, 2).


GOMES, José; RIBEIRO, Manuel - Parte dos Salários no Rendimento Nacional. José Gomes, Manuel Ribeiro. Ed. José Gomes, Manuel Ribeiro. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1972. 102 p. (V. N. de Famalicão: Gráfisa). (Economia).



KOSING, Alfred - O revisionismo Contemporâneo: significado e funções. Alfred Kosing; Trad. Álvaro Machado, [Telmo Machado]. Ed. Àlvaro Machado, [Telmo Machado]. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1971. 36 p. (Porto: Orgal). (Cadernos Vanguarda; 4).
Este livro contém dois tradutores em exemplares iguais:num, aparece o nome de Álvaro Machado e num outro onome de Telmo Machado. Terá sido um erro tipográfico ou de salvaguardar as pessoas em causa?



LOPES, Agostinho - A Política da Mão-de-Obra Barata do Ministério da Educação Nacional: reflexões críticas sobre o Decreto 331/71. Agostinho Lopes. Ed. Agostinho Lopes. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1972. 69 p. (V. N. de Famalicão: Gráfisa). (Ensino e Pedagogia; 1).



PEREIRA, José Pacheco - Questões Sobre o Movimento Operário Português e a Revolução Russa de 1917. José Pacheco Pereira. Ed. José Pacheco Pereira. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1971. 102 p. (Porto: Orgal). (Temas Sociais; 1).



SILVA, José - Memórias de um Operário. José Silva; Pref. Victor de Sá.  Porto: Manuel Duarte, 1971(Vila Nova de Famalicão: Distrib. Livraria Júlio Brandão). 2 vols. (Temas Sociais; 1, 2).



STALINE, J. - O Materialismo Dialéctico, o Materialismo Histórico. J. Staline; Trad. Álvaro Machado. Ed. Álvaro Machado. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1972. 62 p. (V. N. de Famalicão: Gráfisa). (Cadernos Vanguarda; 5).



STALINE, J. - Princípios do Leninismo. J. Staline; Trad. José Ricardo. Ed. José Ricardo. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão],1972. 195 p. (Porto: Orgal). (História e Filosofia; 1 ).




STALINE, J. - Questões do Leninismo. J. Staline; Trad. Álvaro Machado. Ed. Álvaro Machado. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1972. 112 p. (V. N. de Famalicão: Gráfisa). (História e Filosofia; 2).



TSÉ-TUNG, Mao - Da Prática de onde vêm as Ideias Justas. Mao Ysé-Tung; Trad. José Pacheco Pereira, Maria Helena. Ed. José Pacheco Pereira, Maria Helena. [Vila Nova de Famalicão: Livraria Júlio Brandão], 1971. 29 p. (Porto: Tipografia Marca). (Cadernos Vanguarda; 1).

o símbolo da famosa colecção vanguarda


Bibliografia

(2000) - Momentos de Resistência. Coord. Artur Sá da Costa. V. N. de Famalicão: Câmara Municipal.
Artur Sá da Costa - "Momentos de Resistência: razões para um debate", pp. 7-9.
Artur Sá da Costa - "Resistência Cultural ao Fascismo nas Décadas de 60 e 70 no Concelho de Vila Nova de Famalicão", pp. 13-29.
"Depoimentos", pp. 33-60
(Orlando Carvalho, Armando Soares Coelho, Jorge Manuel Mesquita Ferreira da Costa, Júlio de Costa Barros, Salvador Coutinho, Manuel Ferreira Cunha, Manuela Granja, Virgínia Granja, Artur Sousa Lopes, José Augusto Bezerra de Sousa Lopes, Eugénio Mesquita, Custódio de Oliveira, Artur Lopes Simões, Joaquim Santos Simões, Macedo Varela, Joaquim Loureiro)

Sem comentários:

Enviar um comentário